29 janeiro 2010

Cadê o Índio Pescador?


Cadê o índio pescando debaixo do salgueiro-chorão? Cadê a Sears, cadê o cheiro de castanha de caju, o snack bar com salsichas virando em cima de uma grelha rolante e as roupas arrumadas em araras da primeira loja de departamentos que conheci?

Eu deveria ter por volta de dez anos de idade. De vez em quando, subia a Rua Sampaio Viana até a Rua Cubatão, virava na Rafael de Barros passando pela sorveteria Alaska - dos sorvetes de creme nas noites de verão – e atravessava a Praça Oswaldo Cruz. Os motoristas sabiam dirigir, os pedestres sabiam andar pelas ruas e as pessoas eram felizes respeitando umas às outras. Minha mãe deixava, não tinha perigo. Os carros não iriam me esmagar, as pessoas aprendiam na auto-escola a tomar cuidado com as crianças, nenhum pivete iria me atacar com um canivete para roubar meus tênis. A gente não usava tênis.

A estátua do índio era o ponto de referência para qualquer encontro com as amigas, o banco de madeira e ferro debaixo da sombra de uma árvore de verdade era o meu lugar preferido. Hoje, tudo mudou de lugar: o índio foi parar do outro lado, entre uma guia e outra, sem nenhum destaque, custei para achá-lo. Tanto espremeram, retalharam, enfiaram grades e passarelas que eu preciso me preparar psicologicamente antes de atravessar a praça . Como se afunilar, encurralar e empurrar pessoas as fizesse mais disciplinadas. Tudo por uma cidade melhor? Não. Tudo para controlar a selvageria inerente ao ser humano que se manifesta, embora reprimida, na cidade super populada.

[Índio Pescador- estátua em bronze do escultor brasileiro Francisco Leopoldo e Silva*]

*Francisco Leopoldo e Silva (1879- 1948) Discípulo de Amadeo Zani, estudou em Roma com o grande escultor Arturo Dazzi. Ao contrário de Brecheret, (com quem estudou em Paris no ateliê de Arturo Dazzi), que adotara um pesquisa estilística moderna. Leopoldo e Silva que inicialmente seguira o estilo e a técnica de Rodin daí o vigor de suas esculturas, chegando ao Brasil quedou-se numa manifestação mais conservadora, embora com um acentuado lirismo. Assinava L. Silva.

3 comentários:

Tânia Tiburzio (TT) disse...

Gostaria de ter conhecido São Paulo nessa época que você descreve.
O índio ainda está lá mas os selvagens somos nós!
Beijos!!
Bom final de semana.

Blog da Bruna disse...

Oi Sandra: pelo jeito, esta cidade marcou a vc e a mim com suas esculturas.... e com suas árvores.
Como sempre vc sabe criticar poeticamente!

Benedito Deíta disse...

Será mesmo irreverspivel o caminho das pessoas. Com todas suas atitudes de selvageria, quase inevitável nesta São Paulo tão populada. A nostalgia nos paralisa ou será que pode buscar outros movimentos para uma São Paulo, não igual, mas melhor? Beijos