31 janeiro 2016

Mercado Financeiro

Fim de tarde normal no café do Zé. Muitos fregueses faziam hora lá por causa do trânsito. Ás vezes passavam, com pressa, engoliam um cafezinho e iam embora antes do rush, outras vezes ficavam por ali, esperando o movimento dos carros diminuir para depois ir para casa.       

Pensando nisso, Zé achou melhor ter dois tipos de café mais conhecidos no Brasil, assim teria assunto como os clientes, mostraria conhecimento: o arábica, que ele pessoalmente preferia, por ser mais requintado, originário do oriente, cultivado em regiões mais altas e grãos de cor esverdeada; e o robusta, originário da África, sabor típico, baixa acidez e teor mais alto de cafeína. Oferecia também café orgânico e adorava contar que visitou a fazenda e escolheu aquele café porque era um café feliz, crescia solto no meio de outras árvores.

Nos lugares públicos, sempre tem alguém que fala sem parar, muito mais alto que os demais, que chama mais atenção, até pelo timbre de voz ou pela atitude. O homem de terno claro e sapato marrom era assim: não precisava de microfone. Com as pernas espalhadas, apontava a própria têmpora com o indicador e dizia:

- Os caras enlouqueceram. Tão falando que HSBC vai congelar os salários e as novas contratações em 2016, os funcion[ários vão receber e-mail com as medidas a de redução de custos, tudo para aumentar a rentabilidade dos acionistas e está levando adiante planos para conseguir uma economia anual de até 5 billhões de dólares até 2017. Bancos da Europa querem eliminar quase um e cada cinco postos de trabalho e reduzir investimentos em um terço, isso seria uma forma de responder ao fraco crescimento econômico e regulamentações globais mais rígidas. A economia está desacelerando muito e a gente como é que fica? A Dilma, o dólar do jeito que está, essa corrupção descarada, cada dia uma coisa, e lá no banco a coisa está ficando insustentável. Comer sanduíche em frente a três telas de computador... Não dá! Trabalhar dezoito horas por dia virou rotina, cara. O celular não pára de tocar, quanto mais tecnologia mais exigem da gente. Diz que o pessoal da bolsa só falta se comer vivo, trancam os caras no banheiro, se chutam durante o pregão, sacaneam geral. Sabe o que o Medeiros disse? Você lembra dele, né? Meio antigão, tem quatro filhos, a mulher não trabalha... Sabe o que ele falou ontem? Você não vai acreditar. O cara chegou na minha sala babando, falando alto, olho arregalado, logo ele que é tranqüilo, veio contar que cabeças vão rolar. Estava apavorado o coitado. Os caras não querem nem…

- Amore, eu estou sem calcinha – disse a mulher que estava com ele.
-  ...saber. Estava tão vermelho, com as veias saltando da testa que parecia que ia ter um inf.... Quê?
- Hum...hum...Eu estou sem calcinha – repetiu ela remexendo o café.
- Sem nada, só com esse vestidinho. Quer ver?

Abriu a bolsa, tirou de dentro um pedacinho de renda preta e jogou na mesa.

- Ficou louca? Guarda isso já! O que foi que deu em você? Está todo mundo olhando, estamos na rua, sua doida!
- Olhando o quê, fofo? Ninguém sabe. Quis fazer uma surpresinha para você relaxar um pouco. Você anda tão chato...
- Vamos embora. Agora mesmo. Não quero que vejam você assim – disse ele pegando a rendinha e enfiando rapidamente no bolso do paletó.
- Já disse que ninguém sabe. Agora, se eu descruzar a perna assim...
- Pára com isso!
- Eu só queria provocar você, não precisa ficar nervoso, amore. Brincadeirinha...
- Quem disse que eu estou nervoso? Estou louco por você, gata, vem cá!
- Ai! Não me puxa. Deixa que eu levanto sozinha. Onde você quer ir?
- No banheiro, vamos. Você queria provocar não queria? Conseguiu.
- No de homem ou no de mulher? Ai, cuidado, não me aperta seu bruto!
- Qualquer um. Entra aí, vai!

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